CIDADANIA NO BRASIL: O longo caminho
Resumo do Livro de José Murilo de Carvalho, RJ 2001.
CIDADANIA: O
presente texto visa resgatar a problemática da cidadania, seu significado, sua
evolução histórica e suas perspectivas.
Conceito de cidadania:
José Murilo de Carvalho (2001): seguindo a distinção de T. A. Marshall[1],
desdobra a cidadania
em direitos civis (direitos fundamentais à vida, à liberdade, à propriedade, à
igualdade perante a lei. Os direitos civis garantem a vida em sociedade. São
direitos cuja garantia se baseia na
existência de uma justiça independente, eficiente, barata e acessível a todos), políticos (se referem à participação do
cidadão no governo da sociedade. Seu exercício
é limitado a parcela da população e consiste na capacidade de fazer demonstrações
políticas, de organizar partidos, de votar, de ser votado) e sociais
(direitos que garantem a participação na riqueza coletiva. Incluem os direitos à
educação, ao trabalho, ao salário justo, à saúde, à aposentadoria. A
idéia central em que baseiam é a da justiça social) e os cidadãos em plenos
(titulares dos 3 direitos), incompletos (possuidores de apenas alguns dos direitos) e não-cidadãos (os que não se beneficiassem
de nenhum dos direitos).
Para Carvalho
(p.11), se o ideal de cidadania plena é semelhante pelo menos na tradição ocidental, os caminhos são distintos e nem sempre
seguem linha reta (como pretende Marshall). Pode haver desvio e retrocessos. No
caso do Brasil, o autor destaca duas diferenças importantes. "A
primeira refere-se à maior ênfase em um dos direitos, o social, em relação aos
outros. A Segunda refere-se à alteração na sequencia em que os direitos foram
adquiridos: entre nós o social precedeu os outros" (p. 12).
Outro aspecto
destacado por Carvalho (p. 12) é que a cidadania se desenvolveu dentro do
fenômeno a que chamamos de Estado-nação, datado da Revolução Francesa. A luta
pelos direitos era uma luta política
nacional. "Isto quer dizer que a construção da cidadania tem a ver
com a relação das pessoas com o Estado e com a nação" (p. 12). Segundo
Carvalho, a redução do poder do Estado, fruto
da aceleração da internacionalização do sistema capitalista e da criação dos blocos econômicos, afeta a natureza dos
antigos direitos, sobretudo dos direitos políticos e sociais. "Desse modo,
as mudanças recentes têm recolocado
em pauta o debate sobre o problema da cidadania, mesmo nos países em que ele parecia
estar razoavelmente resolvido" (p. 13).
Cidadania no Brasil:
Para Carvalho (2001): no esforço da sociedade para a reconstrução da
democracia no Brasil,
após a ditadura militar, a palavra cidadania não só caiu na boca do povo, mas o
substituiu na retórica política. "Cidadania virou gente". Mas o autor
alerta que "o fenômeno da cidadania é complexo e historicamente
definido" (p.8). Por isso, o exercício de certos direitos não garante
automaticamente o gozo de outros. "Isto porque a cidadania inclui várias dimensõe2s e que algumas podem estar
presentes sem as outras". Desta forma, "uma cidadania plena[2], que
combine liberdade, participação e igualdade para todos, é um ideal desenvolvido no ocidente e talvez
inatingível". (p.9)
O peso do passado (1500-1822).
Segundo Carvalho (p.18): em três séculos de colonização, "os
portugueses tinham construído
um enorme país dotado de unidade territorial, linguística, cultural e
religiosa. Mas tinham também deixado uma
população analfabeta, uma sociedade escravocrata, uma economia
monocultora e latifundiária, um Estado absolutista. (...) O efeito imediato da conquista (que teve conotação comercial) foi a
dominação e o extermínio, pela guerra, pela escravização e pela doença,
de milhões de indígenas". Por isso, à época da independência, "não havia cidadãos brasileiros, nem pátria
brasileira". Havia sim, na economia e sociedade brasileiras, a forte marca do latifúndio
monocult9or e exportador de base escravista.
Segundo o autor
(p. 19-20), a escravidão foi o fator mais negativo para a cidadania. Na época da Independência, o "Estado, os
funcionários públicos, as ordens religiosas, os padres, todos eram
proprietários de escravos. Era tão grande a força da escravidão que os próprios libertos, uma vez livres, adquiriam
escravos. (...) A sociedade colonial era escravista de alto a baixo".
"Escravidão e grande propriedade não constituíam ambiente favorável
à formação de futuros
cidadãos". Para o autor, tanto os escravos como os senhores não eram
cidadãos. Aqueles porque não possuíam os
direitos civis básicos[3]
e estes porque, embora fossem livres, votavam e eram votados
("homens bons"), "faltava-lhes, no entanto, o próprio sentido da
cidadania, a noção da igualdade de todos perante a lei" (p. 21). As
funções públicas eram em parte absorvidas
pelos senhores (sobretudo as funções judiciárias) e pelo clero católico
(registros de nascimentos, casamentos e óbitos). "A consequência de tudo
isso era que não existia de verdade um poder que pudesse ser chamado de
público, isto é, que pudesse ser a garantia da igualdade de todos perante a
lei, que pudesse ser a garantia dos
direitos civis" (p.22). Por isso em 1872, meio século após a
independência, apenas 16% da
população era alfabetizada. Segundo o autor, não era do interesse da
administração colonial, ou dos
senhores de escravos, difundir essa arma cívica. No período colonial, "os direitos civis beneficiavam a poucos, os direitos
políticos a pouquíssimos, os direitos sociais
ainda não se falava, pois a assistência social estava a cargo da Igreja e de particulares" (p.24).
Para Carvalho (p. 24) foram raras as manifestações cívicas durante a
Colônia. Para ele, fora as
revoltas escravas (no qual destaca a de Palmares), quase todas as outras foram
conflitos entre setores dominantes ou
reações de brasileiros contra o domínio colonial (no qual destaca a
Inconfidência Mineira e as Revoltas dos Alfaiates e Pernambucana). Segundo o autor, o período colonial chegou ao fim "com
a grande maioria da população excluída dos direitos civis e políticos e sem a existência de um sentido de
nacionalidade". (p. 25)
1822: Os direitos políticos
saem na frente.
Para Carvalho (p. 25), a independência não introduziu mudança radical no
panorama descrito, talvez em função de que a independência do
Brasil foi relativamente pacífica, isto é, negociada. A separação foi feita
mantendo-se a monarquia e a casa de Bragança. "A principal característica
política da independência brasileira foi a negociação entre a elite nacional, a
coroa portuguesa e a Inglaterra, tendo como figura mediadora o príncipe D.
Pedro" (p.26). A preocupação da elite com a ordem social (receio do
"haitianismo") e o sonho da construção de um novo império, levou à
escolha de uma solução monárquica.
"Nada
melhor do que um rei para garantir uma transição tranquila, sobretudo se esse
rei contasse, como contava, com apoio
popular" (p.27). Para o autor, o papel do povo, se não foi de
simples espectador (Eduardo Prado), também não foi decisivo. O papel do povo
foi mais decisivo em 1831, quando o
primeiro imperador foi forçado o renunciar, após grande agitação popular
nas ruas do Rio de Janeiro. Ao povo uniram-se a tropa e vários políticos em raro momento de confraternização.
"Assim, apesar de constituir um avanço no que se refere aos direitos
políticos, a independência,
feita com a manutenção da escravidão, trazia em si grandes limitações aos direitos civis" (p. 28).
Para Carvalho, a
Constituição outorgada de 1824, estabeleceu os 3 poderes tradicionais e criou
ainda um quarto poder, o Moderador, privativo do Imperador. Segundo ele, para
os padrões da época, a legislação brasileira era muito liberal, pois ampliava o
direito ao voto em relação aos padrões dos
países europeus[4] e ainda
permitia que os analfabetos votassem.
Ainda pelo lado positivo, note-se que houve eleições ininterruptas de
1822 até 1930, representando, do ponto de vista formal, um grande
avanço em relação à situação colonial. Por outro lado,
"Os brasileiros tornados cidadãos pela Constituição eram as mesmas pessoas
que tinham vivido os três séculos de colonização nas condições que já foram
descritas. Mais de 85% eram analfabetos, incapazes de ler um jornal, um decreto
do governo,
um alvará da justiça, uma postura municipal" (p. 32). Havia ainda a
pressão dos chefes políticos locais sobre os
votantes. As eleições eram frequentemente fraudadas, tumultuadas e violentas.
"O voto era um ato de obediência forçada ou, na melhor das hipóteses, um
ato de lealdade e de gratidão. À medida que o votante se dava conta da importância
do voto para os chefes políticos, ele começava a barganhar mais, a vendê-lo
mais caro. (...) A eleição era a oportunidade para ganhar um dinheiro fácil,
uma roupa, um chapéu novo, um par de
sapatos. No mínimo uma boa refeição" (p.35-36). O encarecimento do
voto preocupava os proprietários rurais, que queriam restringi-lo. "Havia
ainda uma razão material para combater o voto ampliado. Os proprietários rurais
queixavam-se do custo crescente das
eleições. A vitória era importante para manter seu prestígio e o apoio do governo.
Para ganhar precisavam manter um grande número de dependentes para os quais não tinham ocupação econômica, cuja única
finalidade era votar na época de eleições" (p.36).
1881: Tropeço.
A lei liberal de 1881, com a finalidade de eliminar a corrupção
eleitoral e responsabilizando o povo, 5não as elites pelo
desvio, introduziu o voto direto, eliminando o primeiro turno das eleições[5], ao
mesmo tempo que ampliava para 200 mil-réis a exigência de renda, proibia o voto
dos analfabetos e tornava o voto facultativo. Para Carvalho, o maior limite ao
voto ocorreu pela exclusão dos analfabetos,
pois apenas "15% da população era alfabetizada, ou 20%, se
considerarmos apenas a população masculina. De imediato, 80% da população
masculina era excluída do direito de voto" (p.39).
Como consequência, houve uma queda de 1 milhão de votantes ou 13% da
população livre em
1972, para pouco mais de 100 mil
eleitores ou 0,8% da população total. Houve um corte de 90% do eleitorado. Este
retrocesso ocorreu numa época de tendência dos países europeus de ampliar os direitos políticos.
Com a lei de
1881, o Brasil caminhou para trás, perdendo a vantagem que adquirira com a constituição de 1824. O mais grave é que o
retrocesso foi duradouro, pois a Proclamação da República, em 1889, não alterou o quadro, pois a Constituição de 1891
manteve a principal barreira o voto, a exclusão dos analfabetos. Continuavam
também a não votar as mulheres, os
mendigos, os soldados, os membros das ordens religiosas. "Na primeira
eleição popular para a presidência
da República, em 1894, votaram 2,2% da população" (p. 40).
A
descentralização da Primeira República (1889-1930) facilitou a formação de
sólidas oligarquias estaduais, apoiadas em partidos únicos, também estaduais.
Por isso, a Primeira República ficou conhecida com "república dos
coronéis". "Nesse paraíso das oligarquias, as práticas eleitorais
fraudolentas não podiam desaparecer. Elas foram aperfeiçoadas" (p.41).
Por falta de
experiência prévia e de educação primária, o povo não tinha consciência da
importância do voto. E não era culpa sua. "Desta forma, o ganho que a
limitação do voto poderia trazer para a
lisura das eleições era ilusório. A interrupção do aprendizado só poderia
levar, como levou, ao retardamento da incorporação dos cidadãos à vida
política" (p. 45). Por outro lado, a exclusão popular ficou facilitada, de
acordo com o autor, porque, com exceção ao
movimento pelo voto feminino, não houve no Brasil, até 1930 movimentos populares exigindo maior participação eleitoral.
Direitos Civis só na lei.
O Brasil
Independente herdou como herança do período colonial, a escravidão, a grande propriedade rural e um Estado comprometido com o
poder privado. "Esses três empecilhos ao exercício da cidadania
civil revelaram-se persistentes. A escravidão só foi abolida em 1888 [O Brasil era o último país de tradição
cristã e oc6idental a libertar os escravos. E o fez quando o número de escravos
era pouco significativo[6]], a
grande propriedade ainda exerce seu poder
em algumas áreas do país e a desprivatização do poder público é tema da agenda atual de reformas". (p.45).
A persistência
da escravidão, significa que "os valores da escravidão eram aceitos por quase toda a sociedade. Mesmo os escravos, embora
lutassem pela própria liberdade, embora
repudiassem sua escravidão, uma vez libertos admitiam escravizar outros"
(p.49).
Tanto era assim
que no próprio Quilombo dos Palmares havia escravos e 78% dos libertos da Bahia possuíam escravos (p. 46). Desta forma,
tudo indica que "os valores da liberdade individual, base dos
direitos civis, tão caros à modernidade européia e aos fundadores da América do
Norte, não tinham grande peso no Brasil" (p.49). Até que ponto a religião católica, que era oficial, contribuía para esta
mentalidade ao não combater a escravidão? É uma questão a ser refletida.
Ao contrário dos
Estados Unidos, no Brasil, "aos libertos não foram dadas nem escolas, nem terras, nem empregos. (...) As conseqüências
disso foram duradouras para a população negra, Até hoje essa população ocupa
posição inferior em todos os indicadores de qualidade de vida. É a parcela
menos educada da população, com os empregos menos qualificados, os menores
salários, os piores índices de ascensão social" (p. 52).
Para concluir, a "libertação dos escravos não trouxe consigo a
igualdade efetiva. Essa igualdade era afirmada nas leis, mas negada na
prática""(p. 53).
A grande
propriedade, embora profundamente ligada à escravidão, tinha características próprias e teve vida muito mais longa, sendo ainda
uma realidade em várias regiões do país.
Os grandes proprietários, em aliança com comerciantes urbanos,
sustentavam a política do coronelismo. Para Carvalho
(p.55-56), foi "em São Paulo e Minas Gerais que o coronelismo, como sistema político, atingiu a perfeição e contribuiu
para o domínio que os dois estados exerceram sobre a federação[7].
Os coronéis articulavam-se com os governadores, que se articulava com o
presidente da República, quase sempre oriundo dos dois estados".
O coronelismo
impedia a participação política porque antes negava os direitos civis. Nas fazendas o coronel era legislador, executo e juiz.
Desta forma, seus trabalhadores e dependentes
não eram cidadãos do estado brasileiro, eram súditos do coronel.
Várias expressões populares descreviam a situação: "para os
amigos, pão; para os inimigos, pau". Ou então: "Para
os amigos, tudo: para os inimigos, a lei." (p. 57).
"Não havia
justiça, não havia poder verdadeiramente público, não havia cidadãos civis. Nessas circunstâncias, não poderia haver cidadãos
políticos" (p. 57).
Para Carvalho (p. 60) do ponto de vista da cidadania, na década de 20, o
movimento operário em luta por direitos básicos, como o de
organizar-se, de manifestar-se, de escolher o trabalho, pela legislação trabalhista
e de fazer greve, significou um avanço inegável, sobretudo no que se refere aos direitos civis.
Os direitos sociais.
Para Carvalho (p. 61), com direitos civis e políticos tão precários,
seria difícil falar de direitos
sociais. A assistência social estava quase exclusivamente nas mãos de
associações particulares. A Constituição
republicana de 1891, retirou do Estado a obrigação de fornecer educação primária, constante da Constituição de
1824 e proibiu o governo federal de interferir
na regulamentação do trabalho, por considerar violação da liberdade do
exercício profissional. A medida mais importante do período republicano
foi o reconhecimento dos sindicatos como
legítimos representantes dos trabalhadores. "Surpreendentemente, o reconhecimento
dos sindicatos rurais precedeu o dos sindicatos urbanos (1903 e 0907, respectivamente). O fato se explica pela presença
de trabalhadores estrangeiros na cafeicultura", onde as representações
diplomáticas destes países acompanhavam o tratamento dados aos imigrantes (p. 62).
Apesar da Constituição de 1926 autorizar o governo federal a legislar
sobre o assunto, fora o
código de menores nada foi feito na área do trabalho até 1930. Desta forma,
"durante a Primeira república, a
presença do governo nas relações entre patrões e empregados se dava por meio da ingerência da polícia", levando
um candidato à presidência afirmar que a questão social era questão de polícia (p. 62-63).
A primeira lei
eficaz de assistência social, foi a criação de uma Caixa de Aposentadoria e Pensão para os ferroviários[8],
em 1923, que se expandiu, tornando-se o germe da legislação social da
década seguinte.
"As poucas medidas tomadas restringiam-se ao meio urbano. No campo,
a pequena assistência que existia era exercida pelos coronéis. (...) A
dominação exercida pelos coronéis
incluía esses aspectos paternalistas que lhe davam alguma legitimidade. (...)
Em troca do trabalho e da lealdade, o
trabalhador recebia proteção
contra a polícia e assistência em momentos de
necessidade. Havia um entendimento implícito a respeito dessas obrigações mútuas. “Esse lado das relações mascarava a exploração do
trabalhador e ajuda a explicar a durabilidade do poder dos coronéis” (p. 64).
Cidadãos em negativo.
Para Carvalho (p. 65), se é verdade (como queriam Louis Couty e
Gilberto Amado) que até o
final da Primeira República (1930) não havia no país povo politicamente
organizado, opinião pública ativa e eleitorado amplo e esclarecido, não podemos
esquecer que houve alguns movimentos políticos que indicavam um início de
cidadania ativa. O autor cita os movimentos abolicionista, a partir de 1887 e
dos jovens oficiais do Exército, iniciado em 1922.
Para Carvalho (p.66-67), estes autores pecam por adotar uma concepção de
cidadania estreita e formal, que supõe como manifestação política
adequada aquela que se dá dentro dos limites
previstos no sistema legal, sobretudo do direito do voto. Reconhecendo o mesmo
erro, afirma que é necessário levar em conta outras modalidades de
participação, "menos formalizada, externas aos mecanismos legais de
representação". Desta forma, a "avaliação do povo como incapaz de
discernimento político, como apático, incompetente, corrompível, enganável, que
vimos nos debates sobre a eleição direta, revela visão míope, má-fé, ou
incapacidade de percepção. (...) vimos que o eleitor do Império e da Primeira república, dentro de suas limitações, agia com
racionalidade e que não havia entre os líderes
políticos maior preocupação do que a dele com a lisura dos processos
eleitorais" (p. 67). Além disso, para o autor, o povo achava, com frequência,
outras maneiras para se manifestar, como em 1822, quando a população do Rio de
Janeiro foi por várias vezes às ruas, aos
milhares, em apoio aos líderes separatistas, contra as tropas portuguesas; em 1831,
por ocasião do levante que forçou D. Pedro I a renunciar e aclamou seu filho,
uma criança de cinco anos como sucessor.
Mas foi nas áreas rurais que aconteceram as revoltas populares mais
importantes. A primeira
delas foi a Revolta dos Cabanos (pequenos proprietários, índios, camponeses e escravos), em 1832, na fronteira das províncias de
Pernambuco e Alagoas, onde os rebeldes em defesa da Igreja Católica e do
retorno de D. Pedro I, enfrentaram, durante três anos, as tropas do governo em autêntica guerrilha travadas
nas matas da região. Outra revolta popular foi a Balaiada (porque um de
seus líderes era fabricante de balaios), em 1838, no Maranhão, em região de
pequenas propriedades. Defendiam a liberdade e um arraigado catolicismo que julgavam ameaçado pelas reformas
liberais da Regência. A revolta popular mais violenta e dramática foi a
Cabanagem, na província do Pará, iniciada em 1835. Os rebeldes eram na maioria índios, negros e mestiços. A província caiu nas
mãos dos rebeldes, que a proclamaram independente. A luta continuou até 1840 e
foi a mais sangrenta da história do
Brasil. Calculou-se o número total de mortos em 30 mil. Esse número
representava 20% da população da província. "Foi a maior carnificina da
história do Brasil independente" (p.
69).
Várias das revoltas da Regência manifestaram tendências separatistas.
Três delas, a Sabinada,
a Cabanagem e a Farroupilha, proclamaram a independência da província. "O
patriotismo permanecia provincial. O pouco de sentimento nacional que pudesse
haver baseava-se no ódio ao estrangeiro,
sobretudo ao português" (p. 77).
O autor menciona ainda a revolta dos escravos malês de 1835, em
Salvador, afirmando que excetuando-se
esta última revolta, que reclamava claramente o direito civil da liberdade, nenhuma das outras tinha programa, nem mesmo
idéias muito claras sobre suas reivindicações.
"Lutavam por valores que lhes eram caros, independentemente de poderem expressá-los claramente. Havia neles
ressentimentos antigos contra o regime colonial, contra portugueses, contra brancos, contra ricos em geral. (...) O
importante é perceber que
possuíam valores considerados sagrados, que percebiam formas de
injustiça e que estavam dispostos a lutar até a morte por suas crenças (p.70).
Se no Primeiro
Reinado e na Regência, as manifestações populares se beneficiavam de conflitos
entre facções da classe dominante, no Segundo Reinado, com a consolidação do
Estado imperial e os acordos entre liberais e conservados, que se alternavam no
governo promovida pelo Poder Moderador, as
revoltas populares ganharam a característica de reação às reformas
introduzidas pelo governo. Assim, ocorrem as reações contra a lei que introduzia o registro civil de nascimentos e
óbitos e mandava fazer o primeiro recenseamento nacional (1851/2); a lei
do recrutamento militar de 1874, onde as reações atingiram oito províncias e
duraram até 1887[9];
a lei de pesos e medidas a partir de 1871, ganhando o nome de quebra-quilos.
Em Canudos, no
interior da Bahia, sob a liderança de Antônio Conselheiro, milhares de sertanejos tentaram "criar uma comunidade de
santos onde as práticas religiosas tradicionais
seriam preservadas e onde todos poderiam viver irmanados pela fé. Sua comunidade
foi destruída a poder de canhões, em nome da República e da modernidade" (p. 72). No Contestado também estava presente uma
comunidade de santos. Um dos fatores que levaram à formação da
comunidade fora a luta pela propriedade da terra. "A questão social estava
presente, assim como a política" (p.72). Os rebeldes foram arrasados a
ferro e fogo.
"Os movimentos populares da época tiveram quase todos
características anti-republicanas.
Tal foi o caso, por exemplo, da revolta de Canudos. Movimento messiânico
por excelência, foi também abertamente monarquista, mesmo que por
motivações religiosas e tradicionalistas. Outro movimento messiânico, o do
Contestado, também teve caráter monarquista. “Os rebeldes lançaram
manifesto monarquista e escolheram um fazendeiro analfabeto como seu rei” (p. 82).
Em 1880, no Rio de janeiro, ocorreram protestos contra o aumento no
preço das passagens do transporte urbano. Daí em diante, tornaram-se frequentes
as revoltas contra a má qualidade
dos serviços públicos mais fundamentais, como o transporte, a iluminação e o
abastecimento de água (p. 73). A revolta urbana mais importante aconteceu em
1904 e ficou conhecida como a Revolta da Vacina. Foi um protesto popular gerado
pelo acúmulo de insatisfações com o governo em função da lei de reforma urbana e
higiênica da cidade.
Oswaldo Cruz
iniciou o combate à varíola, tradicionalmente feito por meio de vacinação que uma lei tornara obrigatória. Houve
abaixo-assinado contra a obrigatoriedade da vacinação, seguida de revolta
popular generalizada. "O levante teve espontaneidade e dinâmica
próprias. (...) Houve tiroteios, destruição de coches, de postes de iluminação,
de calçamento; prédios públicos foram
danificados, quartéis assaltados. (...) O governo decretou estado de
sítio e chamou tropos de outros estados para controlar a situação" (p. 74).
"Em todas
essas revoltas populares que se deram a partir do início do Segundo Reinado
verifica-se que, apesar de não participar da política oficial, de não votar, ou
de não Ter consciência clara do sentido do voto, a população tinha alguma noção
sobre direitos dos cidadãos e deveres do
Estado. O Estado era aceito por esses cidadãos, desde que não violasse
um pacto implícito de não interferir em sua vida privada, de não desrespeitar
seus valores, sobretudo religiosos. Tais pessoas não podiam ser consideradas
politicamente apáticas. (...) Eram, é
verdade, movimentos reativos e não propositivos. Reagia-se a medidas
racionalizadoras ou secularizadoras do governo. Mas havia nesses rebeldes um esboço de cidadão, mesmo que em negativo"
(p. 75).
"Pode-se
concluir, então, que até 1930 não havia povo organizado politicamente nem sentimento nacional consolidado. A participação
na política nacional, inclusive nos grades acontecimentos, era limitada
a pequenos grupos. A grande maioria do povo tinha com o governo uma relação de distância, de suspeita, quando não de aberto
antagonismo. Quando o povo agia politicamente, em geral o fazia como
reação ao que considerava arbítrio das autoridades.
Era uma cidadania em negativo, se se pode dizer assim. O povo não tinha lugar no
sistema político, seja no Império, seja na República. O Brasil era ainda para
ele uma realidade abstrata. Aos grandes acontecimentos políticos nacionais, ele
assistia, não como bestializado, mas como
curioso, desconfiado, temeroso, talvez um tanto divertido"(p. 83).
Marcha Acelerada
(1930-1964)
O ano de 1930
foi um divisor de águas na história do país, quando, sem grandes batalhas, caiu
a Primeira república, aos 41 anos de via. A partir desta data, houve aceleração
das mudanças sociais e políticas, a história
começou a andar mais rápido (p.87).
A Revolução de 1930, foi c10nseqüência de uma convicção reformista de
pensadores o políticos
como Alberto Torres[10],
entre outros, que foi ganhando força na década de 20, de que era necessário
fortalecer novamente o poder central como condição para implantar as mudanças
que se faziam necessárias.
Uma nova geração
de políticos, de origem oligárquica mas com propostas inovadoras, assumiu o governo do país, após mobilização
revolucionária, que envolveu muitos civis nos estados liberados.
"No Rio Grade do Sul, pode-se dizer que houve verdadeiro entusiasmo cívico. O povo não esteve ausente como em 1889,
não assisti “bestializado” ao desenrolar dos acontecimentos. Foi ator no
drama, posto que coadjuvante" (p.96).
Os direitos sociais
avançaram rapidamente, a partir da criação do Ministério do Trabalho, Indústria
e Comércio e, com ele, a legislação trabalhista e previdenciária, completada em
1943 com a Consolidação das Leis do
Trabalho.
Os direitos
políticos tiveram evolução mais complexa, onde alternaram-se instavelmente ditaduras e regimes democráticos. O período de
1945 a 1964 pode ser considerado a primeira
experiência democrática em toda a história do país. O voto popular foi
estendido e houve maior lisura nas eleições. Esta experiência terminou em 1964,
com a ditadura militar.
Os direitos civis ficaram prejudicados pelas ditaduras, sobretudo pela
suspensão da liberdade
de expressão e de organização. A organização sindical promovida pelo regime
ditatorial foi atrelada ao estado e corporativa. "Tudo se passava dentro
de uma visão que rejeitava o conflito social
e insistia na cooperação entre trabalhadores e patrões, supervisionada pelo Estado" (p. 109). Os
movimentos sociais independentes só avançaram lentamente a partir de 1945. "O nacionalismo, incentivado pelo
Estado Novo, foi o principal instrumento de promoção de uma
solidariedade nacional, acima das lealdades estaduais"
(p.88).
Para Carvalho (p.99), o prolongamento do governo revolucionário provocou
o crescimento da oposição, sobretudo em São Paulo, por parte das elites
que uniram-se e revoltaram-se em 1932. Houve mobilização geral. "A
Revolução Constitucionalista durou três meses e foi a mais importante guerra civil brasileira do século XX. Os paulistas
pediam o fim do governo ditatorial e a convocação de eleições para escolher uma
assembleia constituinte. Sua causa era aparentemente inatacável: a
restauração da legalidade, do governo constitucional. Mas seu espírito era
conservador: buscava-se parar o carro das reformas, deter o tenentismo,
restabelecer o controle do governo federal pelos estados" (p. 100).
Em um país com
tão pouca participação popular, a guerra paulista foi uma exceção. Os paulistas
perderam a guerra no campo de batalha, mas a ganharam no campo da política, pois o governo federal concordou em convocar
eleições para a assembleia constituinte que deveria eleger também o
presidente da República, introduziu o voto secreto e criou uma justiça eleitoral. “O voto secreto e a justiça
eleitoral foram conquistas democráticas”. Houve também avanços na cidadania política. Pela primeira vez as mulheres
ganharam o direito ao voto. “Outra inovação do código eleitoral foi a
introdução da representação classista” (p. 101).
Após a constitucionalização do país, formaram-se dois grandes movimentos
políticos, um à esquerda
(ANL) e outro à direita (AIB). A Aliança Nacional Libertadora (ANL), liderada por Luís Carlos Prestes, era de orientação
comunista e a Ação Integralista Brasileira (AIB), dirigida por Plínio Salgado, era de orientação
fascista. Apesar desta divergência ideológica, "os dois movimentos
se assemelhavam em vários pontos: eram mobilizadores de massa, combatiam o
localismo, pregavam o fortalecimento do governo central, defendiam um Estado intervencionista,
desprezavam o liberalismo, propunham reformas econômicas e sociais. Eram
movimentos que representavam o emergente Brasil Urbano e industrial. (...) ambos se chocavam com o velho Brasil das
oligarquias. (...) ambos atraíam setores de classe média urbana" (p. 103).
Em 1935, a ANL radicalizou, julgando-se capaz de promover uma revolução
popular. Equívoco. Sem apoio popular, não foi difícil para o
governo reprimi-la. A ANL foi fechada e seus simpatizantes perseguidos.
O golpe de 1937 e o estabelecimento do Estado Novo, contaram com o apoio
entusiasta dos integralistas.
A reação ao golpe foi pequena. Como explicar a passividade geral? O autor destaca as seguintes causas: o apoio integralista;
o receio do comunismo; a postura nacionalista e industrializante do
governo. "Em um mundo com sinais claros de que se caminhava para outra guerra mundial, esses projetos tinham forte apelo.
Até mesmo a oposição de esquerda se dividiu diante do golpe, achando
alguns líderes que seus aspectos nacionalistas
mereciam apoio" (p. 107).
Devido ao cuidado de Vargas em estabelecer boas relações com os
industriais paulistas, ao mesmo tempo em que não
descuidava das medidas de proteção ao preço do café, os paulistas que "em 1932 foram à guerra em nome da
constitucionalização, em 1937 davam, pelo interventor,
seu apoio ao golpe e ao governo ditatorial. Nada mais revelador das grandes mudanças que se tinha verificado.
A aceitação ao
golpe indica que os avanços democráticos posteriores a 1930 ainda eram muito
frágeis. (p. 108).
"De 1937 a 1945 o país viveu sob um regime ditatorial civil,
garantido pelas forças armadas, em que manifestações políticas eram proibidas, o
governo legislava por decreto, a censura controlava
a imprensa, os cárceres se enchiam de inimigos do regime" (p.109).
"A política era eliminada, tudo se discutia como se se tratasse de
assunto puramente técnico,
a ser decidido por especialistas". (p.110)
O Estado Novo misturava repressão com paternalismo, sem buscar interferir
exageradamente
na vida privada das pessoas. Era um regime autoritário, não totalitário ao estilo do fascismo, do nazismo, ou do comunismo.
Os direitos sociais na
dianteira (1930-1945).
O período de
1930 a 1945 foi o grande momento da legislação social. Vasta legislação foi
promulgada, culminando com a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), que
resistiu à democratização de 1945 e ainda permanece em vigor com poucas
modificações de fundo.
"Mas foi uma legislação introduzida em ambiente de baixa ou nula
participação política e de
precária vigência dos direitos civis. Este pecado de origem e a maneira como
foram distribuídos os benefícios sociais
tornaram duvidosa sua definição como conquista democrática e
comprometeram em parte sua contribuição para o desenvolvimento de uma cidadania ativa" (p.110)
Vargas foi influenciado pelo positivismo ortodoxo, que propunha
incorporar o proletariado à sociedade por meio de medidas de proteção ao trabalho
e a sua família e enfatizava a cooperação entre trabalhadores e patrões e a
busca de soluções pacíficas para os conflitos (p.111).
Desta forma,
Vargas cria o Ministério do trabalho, Indústria e Comércio, menos de dois meses depois à vitória da revolução. Lindolfo
Collor, também positivista ortodoxo assume o posto. O ministério agiu rapidamente em três direções: trabalhista,
previdenciária e sindical.
Na área
trabalhista,
as principais medidas foram: a criação do Departamento nacional do Trabalho (1931); jornada de 8 horas na indústria
e no comércio (1932); regulamentação do trabalho feminino com igualdade
salarial (1932); regulamentação do trabalho de menores (1932)[11]; criação da carteira de
trabalho e das Comissões e Juntas de Conciliação e Julgamento (1932); regulamentação do direito de
férias.
"Na área da
previdência, os grandes avanços se deram a partir de 1933. Nesse ano, foi
criado o Instituto de Aposentadoria e Pensão dos Marítimos (IAPM)[12],
dando início a um processo de transformação e ampliação das Caixas de
Aposentadoria e Pensão (CAPs) da década de
1920".
"Desse modo, em cindo anos a previdência social foi estendida a
quase todos os trabalhadores urbanos. Foi rapidamente atendida uma velha
reivindicação dos trabalhadores" (p. 114).
O aspecto negativo era que o sistema excluía categorias de trabalhadores,
como os autônomos, os domésticos e todos os trabalhadores rurais,
a maioria na época. "Tratava-se, portanto, de uma concepção da política
social como privilégio e não como direito. (...) Por esta razão, a política social foi bem caracterizada por Wanderley G. dos
Santos como “cidadania regulada”,
isto é, uma cidadania limitada por restrições políticas" (p.115).
A atuação do governo na área sindical constituiu o cerne da estratégia
do governo, do ponto de
vista político. No primeiro decreto sobre sindicalização (1931), aparecia a
filosofia do governo, semelhante à visão dos positivistas do início do século e
também com a doutrina social da Igreja
Católica, onde "as relações entre capital e trabalho deveriam ser harmônicas, e cabia ao Estado garantir a harmonia,
exercendo o papel de regulação e arbitramento.
A organização sindical deveria se o instrumento da harmonia. O sindicato não deveria ser um órgão de representação dos
interesses de operários e patrões, mas de cooperação entre as duas classes e o Estado" (p.115). Desta forma
o sindicato mudava seu caráter em
relação à lei de 1907: deixava de ser uma instituição de direito privado e
passava a ter personalidade jurídica pública; deixava de ser órgão de
representação dos interesses dos operários para ser "órgão consultivo e
técnico" do governo; a pluralidade sindical foi eliminada e substituída
pela unicidade sindical. "Toda a legislação de que vimos falando aplicava-se tanto aos operários como aos
patrões" (p.117).
"... a
interferência do Estado era uma faca de dois gumes. Se protegia com a
legislação trabalhista, constrangia com a legislação sindical. Ao proteger,
interferia na liberdade das organizações
operárias, colocava-as na dependência do Ministério do Trabalho. Se os operários eram fracos para se defender dos
patrões, eles também o eram para se defender do Estado" (p.118). Desta forma, "o movimento operário viveu o
dilema: liberdade sem proteção ou proteção sem liberdade. O ponto
central era o desequilíbrio de forças entre operariado
e patronato" (p.118).
O último esteio
importante da legislação sindical do Estado Novo foi o imposto sindical, criado em 1940, ainda vigente até hoje, apesar dos
esforços para extingui-lo. Por um lado, o imposto sindical permitiu um
fôlego para os sindicatos manter sua burocracia ou mesmo conceder benefícios
adicionais aos sócios (assistência jurídica, médica, dentária etc.) e
incentivava a formação de sindicatos, por outro, não incentivava a
sindicalização, pois o imposto era cobrado
compulsoriamente de todos embora beneficiasse apenas alguns. Outro aspecto negativo, foi o incentivo ao peleguismo,
que estendeu-se às federações, confederações e tribunais. "Os pelegos
eram aliados do governo e dos empregadores, de quem também recebiam favores. Sempre avessos a conflito, alguns podiam
ser bons administradores dos recursos
sindicais e com isto tornar o sindicato atraente pelos benefícios que
oferecia. Mas, em geral, eram figuras detestadas pelos sindicalistas mais aguerridos" , que buscavam desalojá-los, mas
"em um caso como no outro, a base operária era excluída, e o poder
sindical se resumia a um estado-maior sem tropa" (p.122-3).
O trabalhador
rural foi o grande ausente de toda essa legislação. A extensão da legislação social ao campo teve que esperar os governos
militares para ser implementada. Esse grande vazio na legislação indica com
clareza o peso que ainda possuíam os proprietários rurais.
"Apesar de
tudo, porém, não se pode negar que o período de 1930 a 1945 foi a era dos
direitos sociais. Nele foi implantado o grosso da legislação trabalhista e
previdenciária. O que veio depois foi aperfeiçoamento, racionalização e
extensão da legislação a número maior de trabalhadores. Foi também a era da
organização sindical, só modificada em parte após a Segunda democratização, de
1985". (p.124)
Para o avanço da
cidadania, o significado de toda essa legislação foi ambíguo, pois a ação governamental dividia a classe operária e "o
governo invertera a ordem do surgimento dos direitos descrita por
Marshall, introduzira o direito social antes da expansão dos direitos
políticos. Os trabalhadores foram incorporados à sociedade por virtude das leis
sociais e não de sua ação sindical e política independente. Não por acaso as
leis de 1939 e 1943 proibiam greves"
(p.124).
A força popular
de Vargas se fez sentir na eleição de 1950, quando volta ao comando da nação com 49% dos votos contra 30% do competidor
mais próximo. "Seu segundo governo foi o exemplo mais típico do
populismo no Brasil e consolidou sua imagem de „pai dos pobres‟" (p. 125).
O populismo era
um fenômeno urbano e refletia o novo país que surgia distinto do Brasil da Primeira República. "Era avanço na
cidadania, na medida em que trazia as massas para a política. Mas em contrapartida, colocava os
cidadãos em posição de dependência perante os líderes, aos quais votavam lealdade pessoal pelos benefícios que eles de
fato ou supostamente lhes tinham
distribuído. (...) A cidadania que daí resultava era passiva e receptora
antes que ativa e reivindicadora" (p.126).
A vez dos direitos políticos
(1945-1964).
Com a nova constituição de 1946, o país entrou numa fase descrita como a
primeira experiência
democrática de sua história. A constituição manteve as conquistas sociais do período anterior e garantiu os tradicionais
direitos civis e políticos. Até 1964, houve liberdade de imprensa e de organização; houve eleições regulares, sendo o
voto, obrigatório, secreto e direto, estendido a todos os cidadãos com
mais de 18 anos de idade, que não fossem analfabetos ou soldados[13];
vários partidos nacionais foram organizados e funcionaram livremente[14], à
exceção do Partido Comunista, que teve seu registro cassado em 1947[15]. Uma
das poucas restrições sérias ao exercício da liberdade referia-se ao direito de greve, cuja lei foi aprovada em 1964, já no
governo militar.
Apesar das limitações, a partir de 1945 a participação do povo na
política cresceu significativamente, tanto pelo lado das eleições como da
ação política organizada em partidos, sindicatos, ligas camponesas e outras
associações. "Em números absolutos, os votantes
pularam de 1,8 milhão em 1930 para 12,5 milhões em 1960. Nas eleições legislativas de 1962, as últimas antes do golpe
de 1964, votaram 14,7 milhões". (p.146)
Neste período, pelo lado nacionalista, destacou-se a luta pelo monopólio
estatal da exploração e refino do petróleo, corporificada na criação da
Petrobrás em 1953. A Petrobrás tornou-se o símbolo do nacionalismo, do
anti-imperialismo. "Guerra fria, petróleo e política sindical e trabalhista
foram exatamente as causas dos principais enfrentamentos políticos"(p.128). De um lado ficavam os
nacionalistas, defensores do monopólio estatal do petróleo e de outros recursos
básicos, como a energia elétrica, partidários do protecionismo industrial, da política trabalhista, da
independência na política externa; do outro lado estavam os defensores
da abertura do mercado ao capital externo, inclusive na área dos recursos
naturais, os que condenavam a aproximação entre o governo e os sindicatos, os que queriam uma política externa de estrita
cooperação com os Estados Unidos (p.128-9).
O ano de 1954 foi marcado por greves importantes, que apressaram a
conspiração liderada pelo
udenista pró-americano Carlos Lacerda, que levaram ao desfecho trágico
conhecido, ou seja, o suicídio de Vargas, e
a reação popular instantânea e espontânea.
"O antigo
ditador, que nunca se salientara pelo amor às instituições democráticas,
tornara- se um herói popular por sua
política social e trabalhista. O povo identificara nele o primeiro presidente da República que o interpelara
diretamente, que se preocupara com seus problemas. O fato de ser
preocupação paternalista era irrelevante para os que se sentiram valorizados e
beneficiados pelo líder morto. A influência de Vargas projetou-se ainda por
vários anos na política nacional. O choque de forças que levou a seu suicídio
resolveu-se apenas com o golpe militar de 1964", derrotando o primeiro
experimento democrático da história do país (p.131).
Kubitschek,
considerado herdeiro de Vargas, com muita habilidade e apoiado na aliança dos dois grandes partidos, PSD e PTB, aprofundou o
processo democrático em curso, "sem recorrer a medidas provisória
de exceção, à censura à imprensa, a qualquer meio legal e ilegal de restrição
da participação. (...) Foi a época áurea do desenvolvimentismo, que não excluía
a cooperação do capital estrangeiro" (p.132).
As altas taxas
de crescimento, em torno de 7% ao ano, que possibilitava a distribuição de benefícios a todos, operários e patrões,
industriais nacionais e estrangeiros, amorteceram os conflitos anteriores. O salário mínimo real
atingiu seus índices mais altos até hoje. Os industriais tiveram incentivos generosos.
Restava o setor
rural. Kubitschek também não tocou provavelmente para não romper sua base de
sustentação política, já que o PSD tinha sua base entre os proprietários
rurais. Os trabalhadores rurais
permaneceram foram da legislação social e sindical.
Os dois presidentes - Jânio Quadros e João Goulart - que realmente se
propuseram a mexer na
questão agrária não terminaram o mandato. A insistência de Goulart às Reformas
de Base e a radicalização de parte de seu grupo de apoio, facilitaram sua
associação com o comunismo, levando ao golpe militar de 1964. "O bordão do
anticomunismo foi usado intensamente. Planos
para derrubar o presidente começaram a ser traçados, contando com a simpatia do governo norte-americano" (p.
136).
A grande novidade, no entanto, veio do campo, a partir de 1955, através
das Ligas Camponesas, onde pela primeira vez na história do país, excetuando-se
as revoltas camponesas
do século XIX, os trabalhadores rurais, posseiros e pequenos proprietários entraram na política nacional com voz própria.
Em 1963, o
governo promulgou um Estatuto do Trabalhador Rural, que pela primeira vez estendia ao campo a legislação trabalhista. O
Estatuto previa ainda a extensão da previdência
ao campo. Mas esta parte da lei permaneceu letra morta, pois não foram
previstos recursos para a 9implantação e o financiamento dos benefícios. Por
isso, os trabalhadores rurais
"continuaram excluídos" (p.153).
A partir do Estatuto do Trabalhador Rural, "impulsionado por
grupos de esquerda, inclusive a Igreja e a AP, o
sindicalismo rural espalhou-se com rapidez pelo país, relegando as Ligas Camponesas a segundo
plano. (...) Os sindicatos, em regime populista, tinham sobre as Ligas a enorme
vantagem de poder contar com o apoio do governo e da grande máquina sindical e previdenciária. (p.139).
A vinculação ao governo reduz mas não destrói a importância da emergência
do sindicalismo
rural. Em 1960, 55% da população do país ainda morava no campo, e o setor primário da economia ocupava 54% da mão-de-obra.
"Desde a abolição da escravidão, em 1888, o Estado não se envolvera
nas relações de trabalho agrícola, se excetuarmos a lei de 1903, que teve pouca
aplicação". (p. 139)
A emergência do
sindicalismo rural num regime de liberdade política e sua vinculação ao movimento nacional de esquerda que, entre outras
mudanças estruturais, reclamava a reforma agrária, constituía uma ameaça
aos proprietários, que passaram a se organizar e preparar para resistência
armada ao que consideravam um perigo de expropriação de suas terras ao estilo soviético ou cubano.
As mobilizações
com apoio do governo federal em torno das "reformas de base",
sobretudo à reforma agrária, que implicava
em emendar a Constituição, culminam nos comícios sob o lema "Marcha da Família
com Deus pela Liberdade"[16],
um apelo astucioso aos sentimentos religiosos
da grande maioria da população, que em São Paulo reuniu cerca de 500 mil pessoas.
Estava preparado o golpe militar, cuja concretização viria no dia 31 de março, apoiada nos desdobramentos da revolta dos
marinheiros, de 26 de março de 1964, liderada por um agente da CIA
americana.
Para Carvalho (p. 150): O golpe de 1964, num contexto de condições
favoráveis à democracia, pode ser buscado "na falta de convicção
democrática das elites, tanto de esquerda como de direita. Os dois lados
se envolveram em uma corrida pelo controle do governo que deixava de lado a
prática da democracia representativa. Direita e esquerda preparavam um golpe
nas instituições". A direita para impedir as reformas e para evitar o que achavam ser um golpe comunista-sindicalista
em preparação. A esquerda, com Leonel Brizola
à frente, para eliminar os obstáculos às reformas e neutralizar o golpe de
direita que acreditavam estar em preparação.
"Pelo lado
da direita, o golpismo não era novidade. Desde 1945, liberais e conservadores vinham tentando eliminar da política nacional
Vargas e sua herança. O liberalismo brasileiro
não conseguiu assimilar a entrada do povo na política. (...) O povo,
representado na época pela prática populista e sindicalista, era
considerado pura massa de manobra de políticos
corruptos e demagogos e de comunistas liberticidas. O povo perturbava o funcionamento
da democracia dos liberais. Para eles, o governo do país não podia sair do controle de suas elites esclarecidas"
(p.151). Por outro lado, a parte democrática da esquerda era muito reduzida.
"A parcela maior, constituída pelo Partido Comunista desprezava a democracia liberal, vista como
instrumento de dominação burguesa. Se a aceitava
era apenas como meio de chegar ao poder. (...) Para ambos os lados, direita e esquerda, a democracia era, assim, apenas um meio
que podia e devia ser descartado desde o
momento que não tivesse mais utilidade".
III Passo atrás, passo adiante
(1964-1985).
Passo atrás: nova ditadura
(1964-74).
O rápido aumento
da participação política levou em 1964, como em 1937, a uma reação defensiva e
à imposição de mais um regime ditatorial em que os direitos civis e políticos
foram restringidos pela violência. A semelhança ocorreu ainda pela ênfase aos
direitos sociais, agora estendidos aos
trabalhadores rurais e pela forte atuação do Estado na promoção do
desenvolvimento econômico. A diferença
foi a manutenção do funcionamento do Congresso e da realização de
eleições no regime militar. Contudo, a repressão
política dos governos militares foi mais extensa e mais violenta do que a do Estado
Novo. Sobretudo, nos anos 1964-5 e 1968-74, por meio dos Atos Institucionais[17], foram cassados mandatos e suspenso direitos
políticos de grande número de líderes políticos,
sindicais e intelectuais e de militares. Além disso, foram usados outros mecanismos, como a aposentadoria forçada,
intervenções sindicais, invasões, perseguições, prisões e condenação de
opositores. Novamente o perigo comunista servia como desculpa para justificar a
repressão.
A ditadura alternou fase de repressão e abrandamento, sendo a fase de
1968 a 1974, a mais sombria da história do país, do ponto de vista dos direitos
civis e políticos. Sob o comando de Médici, as medidas repressivas atingiram
o cume. Nova lei de segurança nacional foi introduzida,
incluindo a pena de morte por fuzilamento. No início de 1970, foi introduzido a
censura prévia em jornais, livros e outros meios de comunicação. "A
censura à imprensa eliminou a
liberdade de opinião; não havia liberdade de reunião; os partidos eram
regulados e controlados pelo governo; os sindicatos estavam sob constante
ameaça de intervenção; era proibido fazer greves; o direito de defesa
era cerceado pelas prisões arbitrárias; a justiça militar julgava crimes civis;
a inviolabilidade do lar e da correspondência não existia; a integridade física
era violada pela tortura nos cárceres do governo; o próprio direito à vida era desrespeitado" (p.163-4)
Paradoxalmente,
"o período combinou a repressão política mais violenta já vista no país
com índices também jamais vistos de crescimento econômico. Em contraste com as
taxas de crescimento, o salário mínimo
continuou a decrescer" (p.158). "Foi a época em que se falou no „milagre‟ econômico brasileiro. A partir
de 1977, o crescimento começou a cair, chegando ao ponto mais baixo em
1983, com - 3,2%, subindo depois para 5% em 1984, último ano completo de governo militar" (p.168).
“A rápida expansão da economia veio acompanhada de grandes transformações
na demografia e na composição da oferta de empregos”. Houve grande deslocamento de população do campo
para as cidades. Em 1960 a população urbana era de 44,7% do total, o país era
majoritariamente rural. Em 1980, em apenas 20 anos, ela havia saltado para
67,6%. Em números absolutos, a população urbana aumentara em
cerca de 50 milhões de pessoas. Os efeitos catastróficos desse
crescimento para a vida das grandes cidades só apareceriam mais tarde" (p.169). (Conceito de
rural/urbano?). Houve ainda mudança nos tipos de emprego. A ocupação no
setor primário caiu de 54% do total em 1960 para 30% em 1980.
A ocupação no secundário cresceu de 13% para 24% no mesmo período e o
terciário cresceu
de 33% para 46%. (p.170)
"Houve, sem dúvida, um crescimento rápido, mas ele beneficiou de
maneira muito desigual os
vários setores da população. A consequência foi que, ao final, as desigualdades
tinham crescido ao invés de diminuir" (p.168). O salário mínimo, em 1974
valia quase a metade que em 1960.
Em resposta, grupos de esquerda começaram a agir na clandestinidade e
adotar táticas militares de guerrilha urbana e rural. "Aos sequestros
e assaltos a bancos dos guerrilheiros, respondia a repressão com prisões
arbitrárias, tortura sistemática de presos, assassinatos". (p. 163)
"Segundo
levantamento de Marcos Figueiredo, entre 1964 e 1973 foram punidas, com perdas de direitos políticos, cassação de mandato,
aposentadoria e demissão, 4.841 pessoas..."(p. 164). Entre 1964 e
1970, foram 536 intervenções, sendo 483 em sindicatos, 49 em federações e quatro em confederações. "A única instituição
que conseguiu defender- se, apesar de
alguns conflitos com o governo, foi a Igreja Católica. Por seu poder e influência,
a hierarquia da Igreja foi capaz de oferecer resistência e tornar-se aos poucos
tornar-se o principal foco de oposição legal" (p.165).
Novamente os direitos sociais.
Ao mesmo tempo
em que cerceavam os direitos políticos e civis, os governos militares investiam
na expansão dos direitos sociais. Em 1966 foi criado o Instituto Nacional de
Previdência Social (INPS), universalizando e unificando o sistema de
previdência. Em 1971, em pleno governo Médici foi criado o Fundo de Assistência
Rural (Funrural), que efetivamente incluía
os trabalhadores rurais na previdência. Finalmente, "os eternos párias do sistema, os trabalhadores rurais, tinham
afinal, direito a aposentadoria e pensão, além de assistência
médica" (p.171).
A distribuição
dos benefícios do Funrural, assim como de outras formas de assistência, foi entregue aos sindicatos rurais. "A repressão
inicial exercida contra esses sindicato, aliada às tarefas de assistência agora a eles atribuída,
contribuiu muito para reduzir sua combatividade
política e gerou dividendos políticos para os governos militares. O eleitorado
rural os apoiou em todas as eleições (Sudoeste, 1982, foi exceção?).
Parte desse apoio pode ser atribuída ao conservadorismo rural, mas sem dúvida a
legislação social contribuiu para reforçar
essa tradição. Como a previdência rural não onerava os proprietários e
não se falava mais em reforma agrária, também eles tinham motivos para apoiar o governo" (p.172)
Não ficaram por
aí as inovações no campo social. Empregadas domésticas e trabalhadores autônomos, as duas categorias ainda excluídas
foram incorporadas em 1972 e 1973 respectivamente. Como coroamento das
políticas sociais, foi criado em 1974 o Ministério da Previdência e Assistência
Social.
Passo adiante: voltam os
direitos civis e políticos (1974-85).
Empossado, o
general Ernesto Geisel assinalou para um lento retorno à democracia. Desta forma, o pontapé inicial da abertura partiu dos
militares, não da pressão oposicionista. Esta aproveitou com
inteligência o espaço que se abria e contribuiu decisivamente para levar a bom
êxito a empreitada. Onze anos depois seria eleito o primeiro presidente civil,
marco final do ciclo militar (p. 173).
"A abertura começou em 1974, quando o general presidente diminuiu
as restrições à propaganda
eleitoral, e deu um grande passo em 1978, com a revogação do AI-5, o fim da censura prévia e a volta dos primeiros exilados
políticos" (p.173).
Entre as razões
para a abertura, o autor cita: a postura do grupo de Geisel, ligados à ESG, que
tinham convicção política liberal, embora não democrática; a crise do petróleo
(1973), que comprometia a continuidade do milagre; a ambição do poder e do
lucro presente nas forças armadas que
comprometia a moral do oficialato e a imagem da corporação. "Nessa conjuntura,
seria melhor para o governo e para os militares promover a redemocratização
enquanto ainda houvesse prosperidade econômica do que aguardar para fazê-lo em
época de crise..." (p.174).
Em 1978, o Congresso votou o fim do AI-5, o fim da censura prévia no
rádio e na televisão, e o restabelecimento do habeas corpus para crimes
políticos. Em 1979, o Congresso votou uma lei de anistia, que embora polêmica,
devolveu os direitos políticos aos que os tinham perdido e ajudou a renovar a
luta política. Ainda em 1979 foi abolido o bipartidarismo forçado.
Desapareceram Arena e MDB, dando lugar a seis novos partidos, sendo a criação do Partido dos Trabalhadores (PT) em 1980 a
grande novidade no campo partidário. Outra medida liberalizante permitiu eleições diretas para governadores de
estados.
No campo sindical também houve inovação, vinda sobretudo dos operários
e setores novos da
economia que se tinham expandido durante o "milagre": o de bens de
consumo durável e de bens de capital - metalúrgicos. "O movimento começou
em 1977, com uma campanha por recuperação
salarial, e culminou em 1978 e 1979, com grandes greves que se estenderam a outras partes do país. Em 1978, cerca
de 300 mil operários entraram em greve; em 1979, acima de 3 milhões,
abrangendo as mais diversas categorias profissionais, inclusive trabalhadores rurais. Eram as primeiras greves, desde
1968" (p.180).
O novo
sindicalismo distinguia-se do anterior pelo fato de ser organizado de baixo
para cima e pela insistência de manter-se
independente do controle do Estado. As decisões finais eram tomadas em
grandes assembleias que reuniam às vezes até 150 mil operários, e não por pequenos comitês de dirigentes.
Era também nova a forte presença de sindicatos rurais. Ausentes até
1963, no regime militar eles cresceram transformados em órgãos
assistencialistas. "O número de sindicatos rurais
cresceu rapidamente, a ponto de em 1979 ser praticamente igual o número de trabalhadores
sindicalizados rurais e urbanos (5 milhões para cada lado). Como sindicatos assistencialistas, não se podia esperar grande
mobilização política de sua parte. Mas a própria natureza violenta dos
conflitos de terra e a ação da Igreja Católica por meio de sua Comissão
Pastoral da Terra contribuíram para alterar o quadro". Em 1979, houve
greves entre os cortadores de cana de
Pernambuco e a CONTAG se firmou.
"Fora do mundo partidário e sindical, houve também grandes
modificações no movimento popular. (...) Dentro da Igreja Católica, no
espírito da teologia da libertação, surgiram as Comunidades Eclesiais de Base (CEBs)" (p.183). A partir de
Medellín (1968), a hierarquia católica moveu-se com firmeza na direção da
defesa dos direitos humanos e da oposição ao regime militar. Ela se tornou um
baluarte da luta contra a ditadura.
As CEBs surgiram em torno de 1975 e expandiram-se por todo o país,
abrangendo também as áreas rurais. Por volta de 1985, seu número estava em
torno de 80 mil. "Antes de 1964, os setores militantes da Igreja atuavam
nos sindicatos e no movimento estudantil por meio da Juventude Operária Católica (JOC) e das juventudes Estudantil e
Universitária Católicas (JEC e
JUC)" (p.183) [omissão da Juventude Agrária Católica - JAC].
"É
importante notar que as CEBs constituíam outro exemplo da tendência dos anos 80
de abandonar orientações de cúpula e buscar
o contato direto com a população" (p. 184).
Desde a Segunda
metade dos anos 70, houve enorme expansão dos movimentos sociais urbano, especialmente de moradores e favelados,
que caracterizavam-se por estarem voltados para problemas concretos da
vida cotidiana. Estes movimentos representavam o despertar da consciência de direitos e serviram para a formação de
lideranças políticas.
Houve ainda grande expansão de associações de profissionais de classe
média, como médicos, professores, engenheiros e funcionários públicos,
que juntamente com os sindicatos
tornaram-se focos de mobilização profissional e política. Também se firmaram como pontos de resistência ao governo militar, a
Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), a Associação
Brasileira de Imprensa (ABI), a Sociedade Brasileira para o progresso da
Ciência (SBPC), além de artistas e intelectuais. O auge da mobilização popular
foi a campanha pelas eleições diretas, em 1984. "A campanha das
diretas foi, sem dúvida, a maior mobilização popular da história do país, se
medida pelo número de pessoas que nas capitais
e nas maiores cidades saíram às ruas" (p. 188). Os comícios
transformaram-se em grandes festas cívicas, onde compareciam líderes de
partidos políticos, de associações influentes, jogadores de futebol, cantores e
artistas etc. "Faltaram 22 votos para a maioria de dois terços em favor da
emenda. (...) Apesar da frustração, a campanha das ruas não foi inútil", pois Tancredo Neves ganharia as
próximas eleições indiretas.
Um balanço do período militar.
Do ponto de
vista da cidadania, os 21 anos de governo militar, "houve retrocessos
claros, houve avanços também claros, a partir de 1974, e houve situações
ambíguas" (p.190).
Os governos militares repetiram a tática do Estado
Novo, no que refere-se à relação entre direitos sociais e políticos, ou
seja: ampliaram os direitos sociais ao mesmo tempo em que restringiram os direitos políticos. Desta forma,
pode-se dizer que o autoritarismo brasileiro pós-30 sempre procurou
compensar a falta de liberdade política com paternalismo social.
Tática que teve grande êxito nos anos 30, como atestam a popularidade
do varguismo e sua grande
vida. No período militar a eficácia foi menor, devido à maior mobilização
política anterior ao golpe; à oposição da máquina sindical corporativa montada
durante o Estado Novo, à unificação e
uniformização do sistema previdenciário, cuja racionalização representou para ela perda política; à fragilidade
organizativa do setor rural (principal benefiária da ação governamental)
que em 1964 tinha apenas um ano de sindicalização Comissão Pastoral da Terra
contribuíram para alterar o quadro". Em 1979, houve greves entre os cortadores de cana de Pernambuco e a
CONTAG se firmou.
"Fora do mundo partidário e sindical, houve também grandes
modificações no movimento popular. (...) Dentro da Igreja Católica, no
espírito da teologia da libertação, surgiram as Comunidades Eclesiais de Base (CEBs)" (p.183). A partir de
Medellín (1968), a hierarquia católica moveu-se com firmeza na direção da
defesa dos direitos humanos e da oposição ao regime militar. Ela se tornou um
baluarte da luta contra a ditadura.
As CEBs surgiram em torno de 1975 e expandiram-se por todo o país,
abrangendo também as áreas rurais. Por volta de 1985, seu número estava em
torno de 80 mil. "Antes de 1964, os setores militantes da Igreja atuavam
nos sindicatos e no movimento estudantil por meio da Juventude Operária Católica (JOC) e das juventudes Estudantil e Universitária
Católicas (JEC e JUC)" (p.183)
[omissão da Juventude Agrária Católica - JAC].
"É
importante notar que as CEBs constituíam outro exemplo da tendência dos anos 80
de abandonar orientações de cúpula e buscar
o contato direto com a população" (p. 184).
Desde a Segunda
metade dos anos 70, houve enorme expansão dos movimentos sociais urbano, especialmente de moradores e favelados,
que caracterizavam-se por estarem voltados para problemas concretos da
vida cotidiana. Estes movimentos representavam o despertar da consciência de direitos e serviram para a formação de
lideranças políticas.
Houve ainda grande expansão de associações de profissionais de classe
média, como médicos, professores, engenheiros e funcionários públicos,
que juntamente com os sindicatos
tornaram-se focos de mobilização profissional e política. Também se firmaram como pontos de resistência ao governo militar, a
Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), a Associação
Brasileira de Imprensa (ABI), a Sociedade Brasileira para o progresso da
Ciência (SBPC), além de artistas e intelectuais. O auge da mobilização popular
foi a campanha pelas eleições diretas, em 1984. "A campanha das
diretas foi, sem dúvida, a maior mobilização popular da história do país, se
medida pelo número de pessoas que nas capitais
e nas maiores cidades saíram às ruas" (p. 188). Os comícios
transformaram-se em grandes festas cívicas, onde compareciam líderes de
partidos políticos, de associações influentes, jogadores de futebol, cantores e
artistas etc. "Faltaram 22 votos para a maioria de dois terços em favor da
emenda. (...) Apesar da frustração, a campanha das ruas não foi inútil", pois Tancredo Neves ganharia as
próximas eleições indiretas.
Um balanço do período militar.
Do ponto de
vista da cidadania, os 21 anos de governo militar, "houve retrocessos
claros, houve avanços também claros, a partir de 1974, e houve situações
ambíguas" (p.190).
Os governos militares repetiram a tática do Estado
Novo, no que refere-se à relação entre direitos sociais e políticos, ou
seja: ampliaram os direitos sociais ao mesmo tempo em que restringiram os direitos políticos. Desta forma,
pode-se dizer que o autoritarismo brasileiro pós-30 sempre procurou
compensar a falta de liberdade política com paternalismo social.
Tática que teve grande êxito nos anos 30, como atestam a popularidade
do varguismo e sua grande
vida. No período militar a eficácia foi menor, devido à maior mobilização
política anterior ao golpe; à oposição da máquina sindical corporativa montada
durante o Estado Novo, à unificação e
uniformização do sistema previdenciário, cuja racionalização representou para ela perda política; à fragilidade
organizativa do setor rural (principal benefiária da ação governamental)
que em 1964 tinha apenas um ano de sindicalização intensa, aliada ao declínio
populacional do mesmo e o contexto internacional desfavorável ao autoritarismo
em contraste com a década de 30. "Os custos interno e externo eram tão altos que os militares mantiveram uma fachada de
democracia e permitiram o funcionamento
dos partidos e do Congresso" (p.191). "O „milagre‟ econômico deixava
a classe média satisfeita, disposta a
fechar os olhos à perda dos direitos políticos. Os trabalhadores rurais
sentiam-se pela primeira vez objeto da atenção do governo. (...) Mas uma vez desaparecido „milagre‟, quando a taxa de
crescimento começou a decrescer, por volta de 1975, o crédito do regime
esgotou-se rapidamente. A classe média inquietou-se e começou a engrossar os
votos da oposição. Os operários urbanos retomaram sua luta por salários e maior autonomia. Os trabalhadores rurais
foram os únicos a permanecer governistas.
As zonas rurais foram o último bastião eleitoral do regime. Mas como seu peso era declinante, não foi capaz de compensar a
grande força oposicionista das cidades" (p.192).
Se o apoio a
Médici revelou baixa convicção democrática, o rápido abandono do regime mostrou maior independência política da
população, que mostrou-se capaz de revalorizar a representação e usá-la contra o governo, no momento oportuno.
"Ainda pelo lado positivo, a queda dos governos militares teve
muito mais participação popular do que a queda do Estado Novo, quando o povo
estava, de fato, ao lado de Vargas" (p.192).
IV - A cidadania após a
redemocratização.
A retomada da supremacia civil em 1985 se fez, até agora, sem
retrocessos. A constituição de 1988 pode ser considerada a
mais liberal e democrática que o país já teve, recebendo por isso a denominação
de Constituição Cidadã. Nesta constituição, a garantia dos direitos civis era preocupação
central. Em 1989 tivemos a primeira eleição direta para presidente desde 1960. Os direitos políticos adquiriram amplitude
nuca antes atingida. No entanto, "a democracia política não resolveu os problemas econômicos mais sérios,
como a desigualdade e o desemprego.
Continuam os problemas da área social, sobretudo na educação, nos serviços de
saúde e saneamento, e houve agravamento da situação dos direitos civis
no que se refere à segurança individual" (p.199).
No que se refere à prática democrática, houve frustrações e avanços
claros. Um dos avanços
foi o surgimento do Movimento dos Sem terra (MST). "De alcance nacional, o
MST representa a incorporação à vida
política de parcela importante da população, tradicionalmente excluída
pela força do latifúndio. (...) Seus métodos, a invasão de terras públicas ou não cultivadas, tangenciam a
ilegalidade, mas, tendo em vista a opressão secular de que foram vítimas
e a extrema lentidão dos governos em resolver o problema agrário, podem ser
considerados legítimos. O MST é o melhor exemplo de um grupo que, utilizando-se
do direito de organização, força sua entrada nas arena política, contribuindo assim para a democratização do sistema"
(p.203).
Houve frustração
da população com a democratização ao perceber que ela não resolveria automaticamente os problemas do dia-a-dia e,
sobretudo a partir do terceiro ano do governo Sarney, constatar que as
velhas práticas políticas, incluindo a corrupção estavam de volta. Esta frustração retorna a uma tradição nacional,
ou seja, procura de um messias salvador da pátria, desembocando na eleição de Collor, personalidade arrogante,
megalomaníaca e sem sustentação política, que participara de um
ambicioso esquema de corrupção jamais visto nos altos escalões do governo.
"As
eleições diretas, aguardadas como salvação nacional, resultaram na escolha de
um presidente despreparado, autoritário, messiânico e sem apoio político no
Congresso. (...) Humildada e ofendida, a população que fora às ruas oito anos
antes para pedir as eleições diretas repetiu a jornada para pedir o impedimento
do primeiro presidente eleito pelo voto direto. (...) O impedimento foi sem
dúvida uma vitória cívica importante. Na história do Brasil e da América Latina, a regra para afastar presidentes indesejados
tem sido revoluções e golpes de Estado. No sistema presidencialista que
nos serviu de modelo, o dos Estados Unidos, o método foi muitas vezes o
assassinato". (p.204-5).
Pode ser
considerado avanço também as duas eleições presidenciais seguintes, feitas em clima de normalidade, embora haja críticas sobre a
aprovação da reeleição.
Direitos sociais sob ameaça.
Embora houve
alguns avanços nas áreas da mortalidade infantil, da esperança de vida ao nascer, na redução do analfabetismo e na educação
fundamental, "em 1997, 32% da população de 15 anos ou mais era
ainda formada de analfabetos funcionais, isto é, que tinham menos de quatro
anos de escolaridade"(p.207). No campo da previdência, embora de positivo,
houve a elevação da aposentadoria dos trabalhadores rurais para o piso de um salário mínimo e a introdução da renda mensal
vitalícia para idosos e deficientes, persiste o problema dos benefícios previdenciários, sobretudo nos baixos valores
das aposentadorias.
Mas as maiores dificuldades sociais referem-se às grandes desigualdades
sociais que caracterizam
o país desde sempre, mas que, segundo o IPEA, tem crescido no período de 1990 a
1998. "A escandalosa desigualdade que concentra nas mãos de poucos a
riqueza nacional tem como conseqüência níveis dolorosos de pobreza e
miséria"(p.208). De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), em
1997, o Brasil tinha 54% de pobres.
"Crescendo
ou não, o país permanece desigual. O efeito positivo sobre a distribuição de renda trazido pelo fim da inflação alta teve
efeito passageiro". (p.209)
Direitos civis retardatários.
Os direitos
civis eliminados pelo regime militar foram recuperados a partir de 1985. Entre eles, salientamos a liberdade de expressão, de
imprensa e de organização. A constituição de 1988, criou o direito de habeas data e o "mandato de
injunção". Definiu também o racismo como crime inafiançável e imprescritível e a tortura como crime
inafiançável e não- anistiável. Ganhou
também o consumidor com a Lei de defesa do Consumidor e a sociedade com
o Programa Nacional dos Direitos Humanos (1996). Relevante ainda, foi a criação dos juizados Especiais de Pequenas Causas
Cíveis e Criminais, em 1995.
"No entanto, pode-se dizer que, dos direitos que compõem a
cidadania, no Brasil são ainda os civis que apresentam as maiores deficiências
em termos de seu conhecimento, extensão e garantias"(p.210). De acordo com
pesquisa realizada na região metropolitana do Rio de Janeiro em 1997, mostrou que 57% dos pesquisados não sabiam mencionar
um só direito e só 12% mencionaram
algum direito civil e quase a metade achava que era legal a prisão por simples suspeita. "Os dados revelam ainda
que educação é o fator que mais bem explica o comportamentos das pessoas no que
se refere ao exercício dos direitos civis e políticos. Os mais educados se
filiam mais a sindicatos, a órgãos de classe, a partidos políticos"
(p.210).
"A falta de
garantia dos direitos civis se verifica sobretudo no que se refere à segurança
individual, à integridade física, ao acesso à justiça. (...) O soldado de
polícia é treinado dentro do espírito
militar, com métodos militares. Ele é preparado para combater e destruir inimigos
e não para proteger cidadãos" (p.211-13).
Conclusão: A cidadania na
encruzilhada.
Nestes 178 anos
de esforço para a construção do cidadão brasileiro, "os progressos feitos são inegáveis mas foram lentos e não escondem o
longo caminho que ainda falta percorrer" (p.219). Na raiz das dificuldades, pode estar o fato de que, no Brasil,
a cronologia e a lógica descrita por
Marshall foram invertidas. "Aqui, primeiro vieram os direitos sociais, implantados
em período de supressão dos direitos políticos e de redução dos direitos civis por um ditador que se tornou popular. Depois
vieram os direitos políticos, de maneira também bizarra. (...)
Finalmente, ainda hoje muitos direitos civis, a base da seqüência de Marshall, continuam, inacessíveis à maioria da
população. A pirâmide dos direitos foi colocada de cabeça para baixo"
(p.219-20). Contudo, "seria tolo achar que só há um caminho para a cidadania. A história de países
como Inglaterra, Alemanha, França, Estados Unidos etc., mostra que não é assim.
Nossa cultura política de excessiva valorização do Poder Executivo e de
impaciência com o funcionamento geralmente mais lento do mecanismo
democrático de decisão, tem levado à busca de soluções mais rápidas por meio
de lideranças carismáticas e messiânicas. Por outro
lado, a inversão dos direitos favoreceu uma visão corporativa dos interesses
coletivos, onde "os benefícios sociais não eram tratados como
direitos de todos, mas como fruto da negociação
de cada categoria com o governo. A sociedade passou a se organizar para garantir
os direitos e os privilégios distribuídos pelo Estado" (p.223). Desta
forma, "a prática política posterior à
redemocratização tem revelado a força das grandes corporações de
banqueiros, comerciantes, industriais, das centrais operárias, dos empregados
públicos, todos lutando pela preservação de
privilégios ou em busca de novos favores. (...) A ausência de ampla organização autônoma da sociedade
faz com que os interesses corporativos consigam prevalecer. A
representação política não funciona para resolver os grandes problemas da maior
parte da população. O papel dos legisladores reduz-se, para a maioria dos votantes, ao de intermediários de
favores pessoais perante o Executivo" (p.223).
O processo de globalização da economia em ritmo acelerado provocou e
continua a provocar
mudanças importantes nas relações entre Estado, sociedade e nação, que eram o
centro da noção e da prática da cidadania ocidental. "A redução do papel
do Estado em benefícios de organismos e
mecanismos de controle internacionais tem impacto direto sobre os
direitos políticos. (...) Grandes decisões políticas e econômicas são tomadas
fora do âmbito nacional" (p.225).
Os direitos sociais também são afetados pelos cortes de benefícios, na
descaracterização do estado
de bem-estar, no desemprego estrutural, fruto da competição feroz entre
empresas.
"Nessa visão, o cidadão se torna cada vez mais um consumidor,
afastado de preocupações com
a política e com os problemas coletivos" (p.226).
"Mas alguns aspectos das mudanças seriam benéficos. O principal é a
ênfase na organização da sociedade. A inversão da sequencia dos direitos
reforçou em nós a supremacia do Estado. Se há algo importante a fazer em termos
de consolidação democrática, é reforçar a organização da sociedade para
dar embasamento social ao político, isto é, para democratizar o poder. A
organização da sociedade não precisa e não deve
ser feita contra o estado em si. Ela deve ser feita contra o Estado
clientelista, corporativo,
colonizado" (p.227).
Contudo, "experiências recentes sugerem otimismo ao apontarem na
direção da colaboração entre sociedade e Estado que não fogem
totalmente à tradição, mas a reorientam na direção sugerida. A primeira tem
origem na sociedade. Trata-se do surgimento das
organizações não-governamentais que, sem serem parte do governo, desenvolvem
atividades de interesse público. (...) de início muito hostis ao governo e dependentes de
apoio financeiro externo, dele se aproximaram após a queda da ditadura e expandiram as fontes internas de recursos. Da
colaboração entre elas e os governos municipais,
estaduais e federal, têm resultado experiências inovadoras no encaminhamento e
na solução de problemas sociais, sobretudo nas áreas de educação e direitos
civis. Essa aproximação não contém o vício
da „estadania‟ e as limitações do corporativismo porque democratiza o
Estado" (p.227).
Após citar a outra mudança ocorrida pelo lado do governo, com as
administrações petistas e suas formas alternativas de envolver a população na
formulação e execução de políticas públicas,
o autor, conclui dizendo que se a escravidão era um câncer que corroía nossa
vida cívica e impedia a construção da
nação, como afirmara José Bonifácio em 1823, "a desigualdade é a
escravidão de hoje, o novo câncer que impede a constituição de uma sociedade
democrática" (p.229).
[1] Para Marshall
primeiro vieram os direitos civis, no século XVIII. Depois, no século XIX,
surgiram os direitos políticos. Finalmente os direitos sociais foram
conquistados no século XX. Para ele trata-se de uma sequencia cronológica e
lógica. “O surgimento sequencial dos direitos sugere que a própria idéia de
direitos, e, portanto, a própria cidadania, é um fenômeno histórico (p.11)
[2] “O cidadão
pleno seria aquele que fosse titular dos direitos civil, políticos e sociais”
(p. 9)
[3] “Aos escravos
só restava o recurso da fuga e da formação de quilombos”(p. 22).
[4] “Segundo
cálculos do historiador Richard Graham, antes de 1881 votavam em torno de 50%
da população adulta masculina. Para efeito de comparação, observe-se que em
torno de 1870 a participação eleitoral na Inglaterra era de 7% da população
total; na Itália, de 2%; em Portugal, de 9%; na Holanda de 2,5%. O sufrágio
universal masculino existia apenas na França e na Suíça, onde foi introduzido
em 1848”(p.31).
[5] “Não haveria
mais, daí em diante, votantes, haveria apenas eleitores” (CARVALHO, p38).
[6] “Na época da Independência, os escravos representavam 30% da
população. (...) Às vésperas da abolição, em 1887, os escravos não passavam de
723 mil, apenas 5% da população do país”(p. 47)
[7]
“O poder dos coronéis era menor na periferia das economias de
exportação e nas áreas de pequena propriedade, como nas colônias de imigrantes
europeus do Sul. Foi nessas regiões que se deram as maiores revoltas populares
durante o período da regência (1831-1840) e onde se verificaram movimentos
messiânicos e de banditismo já na república” (p. 56).
[8] “Suas
características principais eram: contribuição dividida, entre o governo, os
operários e os patrões; administração atribuída a representantes dos patrões e
operários, sem interferência do governo; organização por empresa” (p.63).
[9] Destaca-se
nesta reação a grande presença de mulheres. “Talvez tenha sido esta a primeira
manifestação política coletiva das mulheres no Brasil” (C. p. 71).
[10] “Para Torres,
talvez o mais influente pensador da época, a sociedade brasileira era
desarticulada, não tinha centro de referência, não tinha propósito comum. Cabia
ao Estado organizá-la e fornecer-lhe esse propósito.”(p.93)
[11]
“As Comissões reconheciam convenções coletivas de trabalho, quebrando a
tradição jurídica liberal de só admitir contratos individuais”(p. 112).
[12]
“Os
institutos (IAPs) inovaram em dois sentidos. Não eram baseados em empresas,
como as CAPs, mas em categorias profissionais amplas, como marítimos,
comerciários, bancários etc. Além disso, a administração dos IAPs não ficava a
cargo de empregados e patrões, como no caso das CAPs. O governo era parte
integrante do sistema” (p. 113).
[13]
“A
limitação era importante porque, em 1950, 57% da população ainda era
analfabeta. Como o analfabetismo se concentrava na zona rural, os principais
prejudicados eram os trabalhadores rurais” (p. 145).
[14] Havia 12
partidos nacionais. Os principais eram: PSD (congregação das forças dominantes
locais), PTB (com base na estrutura sindical corporativa) e UDN (oposição
liberal). Segundo pesquisa de opinião pública feita pelo IBOPE em 1964, “em
termos de preferências, o PTB saía na frente com 29%, seguido da UDN com 14% e
do PSD com 7%” (p.149). Ao redor desse núcleo, vários partidos menores se
moviam à direita e à esquerda.
[15] Esta decisão e
a que declarou que suboficiais e sargentos não podiam ser eleitos, representou
um retrocesso democrático.
[16] “promovido por
organizações religiosas, sob inspiração de um padre norte-americano e
financiado por homens de negócio paulistas, o comício, calculado em 500 mil
pessoas, centrou sua retórica no perigo comunista que se alegava vir do governo
federal”(p.142).
[17] O AI-5 foi o
mais radical de todos, o que mais fundo atingiu os direitos políticos e civis.
O Congresso foi fechado, passando o presidente Costa e Silva a governar
ditatorialmente.
Parabéns pelo belo resumo.
ResponderExcluirObrigado.
ResponderExcluirque resumo ! perfeito...
ResponderExcluirEste comentário foi removido por um administrador do blog.
ResponderExcluirExcelente!
ResponderExcluirGostei muito do resumo. Acabei de ler a obra completa de Carvalho e vi seu resumo e resolvi ler e achei ótimmo, parabéns.
ResponderExcluirEsse resumo é sobre o conteúdo completo ,isto sendo antes, durante e depois dos acontecimentos histórico? Alguém poderia me dizer?
ResponderExcluir